Experiência

– Queres tentar? – perguntou ela.

Como ele baixasse a cabeça, retraído, ela tornou:

– E então?

Ele continuou calado. Então, ela franziu a testa, como quem demonstra um sinal de impaciência e, mais uma vez, tentou:

– Por que não respondes?

Ele, ainda cabisbaixo, olhou por cima dos óculos e deixou sair um fio de voz, quase um murmúrio:

– É que sou tímido… Creio que não consigo.

Como quem quisesse animá-lo, ela colocou a mão direita por debaixo do queixo dele, fazendo com que seus dedos levemente lhe colocassem o rosto na mesma direção do seu. Ele se deixou levar, até que seus olhos encontraram os dela. Depois, deixou-os percorrerem cada detalhe daquela face muito branca. Maçãs róseas lhe davam ares de anjo, enquanto aquele nariz delicado parecia completar a plena perfeição. Continuou a observar como se cinco segundos fossem a mais longa eternidade. Minuciosamente, enxergou cada detalhe da testa, das sobrancelhas loiras e claras, com seu contorno sutil e fios muito finos; os olhos esverdeados, com um tom de mistério que parecia encontrar-lhe a alma; mais uma vez o nariz, as maçãs, o tom da pele, o queixo… Até que parou nos lábios. Não eram muito vermelhos. Nem finos, nem grossos. Porém, rosados e inebriantes, sobretudo contornados por aquele sorriso que agora também se mostrava tímido.

– E então, o que me dizes? – arriscou ela.

– Quero! – respondeu, entre resoluto e hesitante.

– Tens medo?

– Sim.

– Vamos começar bem devagar. Primeiro, coloque as mãos aqui. Procure sentir o contorno, deixe que as pontas dos seus dedos corram suavemente e feche os olhos para que seus outros sentidos se agucem mais.

Aos poucos, a respiração dele foi de lenta a ofegante, tal a emoção que corria em seu íntimo. Em dado momento, o coração disparou, e ele foi arrebatado pelo ímpeto. Suas mãos já não corriam mais suavemente, mas com a avidez famélica dos furacões que devoram as paisagens. Aquele instante era belo, talvez, o maior de sua vida e ele, em seus 17 anos ainda incompletos, não cabia em si de contentamento.

– Tenha mais calma. – interrompeu ela – Deixe fluir. Imagine a brisa que acaricia o mar, criando-lhe as ondas, mas sem violentar as águas.

Ele reduziu o ritmo e, novamente tímido, observou aquela figura angelical, cujos traços pareciam ainda mais belos. Os cabelos, presos no alto, à guisa de um coque, deixavam-lhe o pescoço nu, como num sonho que ele havia tido na noite anterior. O vestido rosa contornava-lhe o corpo sem se deixar grudar à pele, caindo, caindo, até atingir os tornozelos muito alvos. Os calcanhares, levemente erguidos, faziam aos pés descalços parecer flutuar, os dedos dos pés pousados naquele tapete de plumas.

– Mais uma vez? – sussurrou ela.

– Certamente. – disse ele.

– Seja suave e deixe que aconteça de forma gradual.

Começando devagar, ele foi deixando que suas mãos seguissem os instintos do coração. Reconheceu cada pequena parte, deixando que sua imaginação levasse adiante o que seus olhos fechados não enxergavam. Gradativamente, foi se entregando ao transe mais característico do prazer até chegar ao êxtase. Deixando perceber aos ouvidos o final daquela harmonia vitoriosa, deixou-se terminar lentamente. E quando procurasse os olhos dela, ansioso pela expressão de suas impressões, ela entregou, num átimo, seu contentamento óbvio:

– Bravo! – exclamou, em felicidade. E bateu palmas para ele que, satisfeito, abraçou-a carinhosamente, despedindo-se:

– Até a próxima aula de piano.

Belo Horizonte, 4 de novembro de 2004 – 23:28.

Marcos Arthur Escrito por:

Inquieto. Curioso. Companheiro da Marina e pai do Otto. Ultramaratonista. Facilitador de aprendizagem. Sócio-fundador na 42formas. Escritor amador. Eterno aprendiz.

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