Belo Horizonte, 2 de abril de 2005 (sábado) – 01:59
Antes mesmo de saber o que eram íons, eu já ouvia aquela velha frase: os opostos se atraem. Mais tarde, aprendi outra teoria, que dizia: semelhante atrai semelhante. Estranho pensar que duas premissas tão aparentemente divergentes possam se completar tão divinamente, quando se conhece a contradição humana.
Sois o sal da terra, dizia Jesus aos discípulos ao explicar a importância do homem no decorrer da tão sonhada evolução terrestre. Voltando à história dos íons, o que seria do sal, se não existissem o cloreto e o sódio? Incompletos sozinhos, tornam-se o tempero, a moeda, o precioso composto que não falta na mais pobre choupana, tão logo unidos.
Bom, mas basta falar de teorias químicas, que disso não entendo, para falar de seres humanos (que entendo ainda menos). Eremitas à parte, há que se concordar que a sociedade é inevitavelmente fundamental até mesmo para estes. Porque, senão, não seriam ermitões e, sim, algo que, em nossa parca linguagem, não temos como definir.
Também não tenho intenção de tecer abordagens sociológicas, fazendo apologias ao fato social ou à dominação “weberiana”. Desejo simplesmente falar de nós, essas criaturas que estranhamente amo e que raramente odeio (às vezes, pra valer).
É que das capacidades mais fantásticas do ser humano é a de aperfeiçoar o outro. Vivemos eternamente nos completando, seja na compreensão ou no desentendimento. Porque, para sermos sal, temos de ser como cátion e ânion, ainda que não necessariamente opostos.
Observando uma poça d’água, com suas adjacentes “companheiras”, percebemos a clareza do contraste entre a atração dos opostos e a aproximação dos semelhantes. As pequenas porções do líquido se procuram, como a boca de uma criança recém-nascida que busca avidamente o seio da mãe. Unindo-se, tornam-se um único “ser”, até que não restem mais gotas a se juntarem ao todo.
Também assim seguem os homens, que não têm como evitar o aprendizado que os opostos – ou semelhantes – lhes impõem, e que estes aceitam voluntária e inconscientemente. Alguns até se dizem (e uns acreditam verdadeiramente nisso) auto-suficientes, e a estes chamamos de “os donos da verdade”. Já reparou como a ironia normalmente permeia a pronunciada sentença?
A mão que busca. A boca que cospe. O cenho que se franze. Os olhos que se abrem diante da beleza ou que se fecham de tristeza. E um emaranhado de pensamentos, palavras, atos e sensações que estão irremediavelmente ligados ao “próximo”, sempre. Porque não há como perceber, como sentir, sem que o outro exista e o provoque. Sem que modifique as disposições alheias. Sem que interfira, seja com o mais ínfimo gesto, nas concepções de vários.
De que resulta? Talvez, isso importe bem menos do que o eterno devir. A transformação permanente. O agora constante que é, ao mesmo tempo agora, antes e depois. Porque aquele que se diz completo simplesmente não percebe o quanto é modificado, a cada instante, pelos mesmos seres que despreza.
02/04/2005 – 02:31
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